Friday, February 18, 2005

O Presente de Aniversário

A insônia de segunda acabou sendo produtiva: por que não visitar o atelier daquele artista que tanto gosto? Esse seria o melhor presente que poderia existir, a realização de um sonho antigo. Hoje, esta noite, sentada no sofá da sala, ainda reflito e me emociono com tudo que se passou no dia da visita. Quando cheguei - acompanhada de minha mãe e meu marido - vi aquelas paredes, cobertas de pinturas, que pinturas! E logo meus olhos se fixaram no retrato de um homem jovem e não tão bonito, mas interessante. O retrato do artista quando jovem exibia um bigode estilo Clark Gable e cabelos negros ondulados; o rosto de um moço cujos olhos sinceros exibiam alegria. E de repente me vi ali, parada em frente àquela comparação inevitável entre o velho e o novo, um belo na pintura e o real, de cabelos brancos raleados. Eu era um galã, ele me disse e nao tive resposta, só pensei que sim. Ele nos serviu wiskey e me perguntou quantos anos tinha. Vinte sete amanhã, senhor. Mas que jovem, que alegria, ele falou para minha mãe. Respondi que já tinha alguns cabelos brancos - os quais ele fez questão de conferir por pura diversão - e que o tempo era implacável.

E a visita prosseguiu. Ele me mostrou seus quadros favoritos. Me mostrou fotos de seus pais e falou de sua juventude. Três retratos dele nos olhavam e eu não conseguia deixar de pensar em toda a tristeza que havia naquele lugar. Um homem sozinho há tantos anos. Ele ria do que falávamos e me deu uma revista para que eu lesse uma reportagem. Mostrou seus quadros à venda e explicou um por um. Apontei meu favorito e apontei também o fato de que eu não poderia pagar por ele. Ele sentado na cadeira e eu em pé, cercada pelo passado e o presente e por tantos, mas tantos sentimentos. Meu marido ofereceu as condições de pagamento do quadro. Ele fez que sim. E eu chorei, surpresa, pelo quadro e pelo artista abandonado. E ao me ver chorar, me disse: você é uma boa alma.