Sunday, January 30, 2005

Papo de Aranha

Fala pausada, monotônica, assuntos entediantes, histórias repetitivas, teorias sem pé nem cabeça, polêmicas, futebol, Lula, música ruim, doenças, acidentes, meus-filhos-minha-vida, comida e só comida, escatologias, papo furado, dieta, religião somada a tentativas de conversão, trabalho, casos que nunca terminam, gente que não consegue continuar uma conversa, chuva, calor ou frio, conversa de nerd, internet, negativismo, tiques nervosos, né, sabe, entende. Gente contando vantagem, falando de plástica, falando mal do marido (ou da mulher), gente que tem mania de escrever tudo que fala, que responde grosseiramente, que tem sempre a palavra final, que acha que tem sempre razao. Gente que fala sempre nas entrelinhas. Gente escrachada, que fala demais. Gente que bebe e fica chato. Gente que nunca tem novidades, que não fala nada da própria vida. Lamúrias, stress, assuntos entediantes, papo de adolescente, papo de radical, papo de velho chato. Papo de aranha.

Tuesday, January 25, 2005

O Dia

A manhã teria um ar de marasmo e preguiça e a tarde passaria lenta e morna, como num romance de Jorge Amado. Que a noite viria, sem falta, viria, e se tudo desse certo traria consigo um ar refrescante, quase que rejuvenescedor, para nossos corpos. E estaríamos deitados, na grama verde em frente de casa, olhando para o céu cheio de estrelas. Pensaríamos nos anos que se passaram e nos que estão por vir. Nos lembraríamos da família e dos amigos, agora tão distantes mas ao mesmo tão perto dentro de nós. E faríamos conjecturas de como seria se tivéssemos continuado por lá. E sentiríamos saudades. Talvez cairiam lágrimas, algumas lágrimas pela mãe que estaria sozinha em outro continente. O que ela estaria fazendo agora?, nos perguntaríamos.

E ele ficaria sério, como costuma ficar quanto está pensativo. E eu falaria sem parar, moto contínuo, e me lembraria de bons momentos e concluiria que certamente deveríamos voltar para uma visita. E nos convenceríamos de que havíamos feito a escolha certa, apesar de que é sempre difícil saber. Não sentimos falta dos lugares, mas sim das pessoas, diríamos um ao outro. Estaríamos em paz e essa paz transparecería em nossos rostos. Mas teríamos uma dor, também tão aparente quanto a paz, que seria a dor da falta. A falta que tudo nos faz. E a dor de sentir alegria por estar longe de tudo.


Monday, January 24, 2005

Ninho de Mafagafos

No meu ninho de mafagafos, tem dois mafagafinhos que se enroscam e brincam boa parte do tempo em que estão acordados. Se um acorda, o outro acorda também. Se um resolve comer, o outro sente fome. Caso queiram beber água, coincidentemente nunca estão sozinhos. Meus mafagafinhos dormem juntos, empilhados, fofos e peludos. Como são lindos!

Brownie, o mafagafo mais velho, cuja graça pela vida havia passado há tempo e cujo amor era direcionado apenas para humanos, encontrou em seu novo amigo, não só um companheiro de traquinagens mas também alguém para dividir o tédio do dia a dia. Muffin, o adotivo recém-chegado, se integrou à casa e ao novo irmão de tal forma que tornou-se impossível para todos que aqui habitam, imaginar que um dia conseguimos viver sem ele.

Como são lindos meus meninos deitados no chão da cozinha, curtindo o piso fresco nesse dia tão quente! São essas pequenas coisas, muito pequenas mesmo, que me fazem querer continuar. E se eu pulasse da minha varanda, setimo andar, agora mesmo?

Delícia seria não precisar conviver com o cinismo nunca mais. Maravilhoso não ter que ouvir o que tenho ouvido ultimamente. Nunca, nunca mais. Na morte, sei que não encontraria pessoas tão mentirosas. Mas me privar dessa visão que me alegra e me mostra que algo muito bom, seja lá um deus ou o que for, deve de fato existir. Não há nada mais lindo que o meu ninho de mafagafos.

Sunday, January 09, 2005

Todo domingo

Todo domingo durmo até tarde e só acordo quando um furão começa a arranhar a porta da cozinha. Todo domingo tem gosto de preguiça, de almoço especial, de corrida na praça e suco natureba na lanchonete. E todo domingo parece ser mais quente do que os outros dias e sempre penso quem me dera ter uma piscina!

Acontece que ter esse tempo para pensar sempre me leva a uma certa depressão: os grandes enigmas que me rondam noite e dia dia e noite acabam me cercando e me vejo sem saída. Tenho mesmo que meditar, afinal hoje não tenho muito o que fazer, não tenho desculpa nenhuma para me dar, já que nada, nada mesmo - como eu odeio domingos! - precisar ser feito.

Estabeleço, dentro de mim - isso me soa tão louco! - que domingo é dia de relaxar, devo pensar na vida e nas minhas grandes questões assoladoras de alma outro dia. Uma sexta à noite, de chuva, seria perfeita. Ou um sábado de feriado, em que nada abre e me verei ilhada em casa. Aí sim quero ver os defeitos dessa minha vida. Enquanto esses dias perfeitos não vêm, quero curtir a vida a dois e observar o sono quieto dos furões. A guerra entre os dois está acabando aos poucos. Eles brigam quando o novato quer invadir o lugar especial do mais velho no sofá. Mas há pouco encontrei os dois dormindo juntos, nariz com nariz, tão lindos. Ah, a vida é boa e os domingos mais ainda.