Friday, December 31, 2004

Resoluções

São essas as resoluções que farei, correr mais e comer menos, amar mais e falar menos, me dar mais para receber mais, pensar, ler e estudar mais. O pior desse ano que passou são as dores que parecem incuráveis e que presinto, dentro de mim, irão continuar latejando e me fisgando vez ou outra. A dor volta sempre sem que eu queira. Mas o pior já passou, pelo menos é isto que sinto. Talvez este tenha sido um ano transitório, de adaptação. Nunca pensei que a adaptação a esta vida fosse demorar tanto tempo.

São as perspectivas que me fazem viver. E é o amor que recebo e que sinto encher minha casa, que me dão a alegria e um pouco de força para continuar. Daí minha maior resolução para 2005: quero finalmente voltar a ser feliz.

Que a chuva continue caindo, linda, na minha janela, deixando o ar com um maravilhoso cheiro de terra.

Brownie, Muffin e Mi, vocês são tudo para mim.

Feliz Ano Novo.


Thursday, December 02, 2004

Em dezembro chove quase todos os dias. O ceu varia entre azul e cinza. Azul quando esta quente e nao chove e cinza nos dias de meio termo e chuva. Da minha janela vejo o predio da frente e uma fila de cabritos atravessando a rua. Me pergunto onde eles vao, a rua nao tem saida. De repente, como se tivesse levado um soco, vejo que eu tambem nao sei aonde ir. Esses cabritos com certeza tem um destino: algum gramado proximo ou, na pior das hipoteses, a panela de alguem. Alem da morte certa, porem, nao consigo ver ou prever nada para mim. Quero dizer, nada em vida. Me lembro de que sempre fui assim, nunca tive muitos planos, desde crianca. E outro dia mesmo ouvi alguem falando na TV que quem nao tem metas, nao chega a lugar nenhum! Pelo jeito, lugar algum e o meu destino.

Todos sairam e entao fiquei sozinha neste apartamento cheio de livros nao lidos e poeira. E me lembro de como fui feliz aqui e como tudo era tao diferente do que e hoje. E como envelheci e tambem fiquei cheia desse po, assim como tudo em minha volta. Sou alguem diferente presa neste corpo e colada/trancada com cadeados invisiveis a este lugar. Pertenco a um lugar diferente.

Thursday, November 25, 2004

Ele lia aquele livro que não tinha parágrafos. Eu pedia para que ele parasse de ler e ele carinhosamente me dizia que pararia no próximo parágrafo. Kertesz me fez chorar na sala de espera do dentista há uns meses. Fui descobrir depois que eu tinha lido o último livro de uma trilogia. E agora ele lê o primeiro, uma edição bonita, mas com a tradução não muito boa, que ganhou de presente de aniversário. Para de ler, apaga a luz! E me lembro do livro, e das divagaçoes de um autor que consegue refletir sobre a vida triste, marcada pelo holocausto e pelo fato de ter sido o único filho sobrevivente de seus pais. Ele se depara com Schopenhauer e Nietzsche pelo caminho. Tao intelectual o Kertesz... Saul Bellow me fez chorar tambem, em Ravelstein. Amos Oz me deixou aos prantos com Meu Michel. Concluo que o problema está em mim, só pode ser.

Peço mais uma vez para ele desligar a luz. Estou ficando impaciente, quero dormir e essa luz na minha cara. Ele me encosta a mão em mim e fala para eu ter calma... No meu sonho, eu estava caminhando pelas ruas de Jerusalém, com Hana Gonen e seu bebê. Ela encontrava o Michel dela mas o meu havia sumido. Como que fui perdê-lo de vista assim? Olho em volta e nada. Um monte de gente mas ninguém se parece com ele. Abro os olhos e ele esta aí, do meu lado, ainda lendo. Por que ler tanto, Michel? São quase meia-noite. Ele me diz que nao tem sono. Durmo de novo e desta vez vejo Ravelstein em seu casaco Lanvin bege, em frente a uma turma de alunos. Ele ia de Platão a Leibniz. E como ele conhecia Aristóteles! Que mente brilhante! Que fantástico! Como ele consegue associar tudo isso? E que sorte a minha fazer parte disto. Mas acordo de novo, com o meu Michel apagando a luz. Pelo jeito sentiu sono - ou pena de mim em dormir no claro.

Tuesday, November 23, 2004

E eu tento desesperadamente acessar aquele site. Quero postar minhas fotos, dizer quais sao os livros que leio, os filmes que vejo, minha cor favorita. Mas por que? Me pergunto qual seria o interesse das outras pessoas na minha vida, logo a minha.
Sao meia-noite e amanha o tecnico da maquina de lavar chega cedo para fazer a manutencao. Meu Deus! O que estou fazendo aqui, grudada nessa cadeira, em frente a essa tela, me irritando com a lentidao da minha super-rapida internet a cabo? O que?
Entao estou aqui. As vezes me pergunto "fazendo o que?", mas eu nao sei, ninguem consegue me responder, eu pareco estar perdida, sem ter onde ir, nao sei quem sao meus amigos - sera que os tenho? Tenho, tenho sim, me convenco e logo depois me acho convencida, cheia de mim, claro que tenho amigos! E tenho um marido e um bicho em casa que me adoram. E o bicho dorme atras da geladeira, tao calmo, feliz, tranquilo. Ouco um dialogo, uma entrevista na radio canadense. Estou fora do Canada ha um ano. Eh inverno lá e outono dentro de mim. Caem folhas e folhas e mais folhas. E faz frio e o vento corta meu rosto e maos por dentro e me sinto sozinha, longe de casa. Porque casa ainda nao é, nao existe, nao tem icone e nem soa permanente. Porque casa esta longe e nao é mais. E por que ser obrigado a chamar de casa isto que nao consegue me confortar?
E eu me lembro dos natais com a neve branca na janela. E os pinheiros verdes, grandes, carregados. E das musicas de natal. "I'm dreaming of a white christmas". Estou sonhando sim. E juro que vou continuar sonhando. Ate um dia nevar no Brasil.

novembro/2004.